sábado, 25 de fevereiro de 2012

O BRASIL NA RIO + 20 - PARTE IX


  O Jornal Oecoambiental está postando partes do “Documento de Contribuição Brasileira à Conferência Rio + 20”. Esta nona parte apresenta a sequência  do CAPÍTULO IV – PROPOSTAS DO BRASIL PARA A RIO+20. Nosso objetivo é estimular o debate na sociedade civil brasileira sobre os temas a serem tratados na Conferência Rio + 20 e na Cúpula dos Povos que acontecerão no Brasil em junho de 2012 no Rio de Janeiro. Envie-nos seus comentários, textos, matérias, artigos a este respeito. Saudações.

PARTE IX

P3. Pacto Global para Produção e Consumo Sustentáveis

   O Brasil propõe que a Rio+20 adote um Pacto Global para Produção e Consumo
Sustentáveis, tendo como referência os avanços alcançados no âmbito do Processo de Marrakesh. O Pacto Global pela Produção e Consumo Sustentáveis é um conjunto de iniciativas que busca promover mudanças nos padrões de produção e consumo em diversos setores. Poderiam ser adotadas, com caráter prioritário, iniciativas que ofereçam suporte político a:

P3. A. Compras Públicas Sustentáveis

   Políticas de compras públicas sustentáveis partem da premissa de que os Governos podem desempenhar papel de destaque na alteração dos padrões de sustentabilidade da produção e do consumo. A aquisição de bens e serviços por agentes públicos – as chamadas contratações públicas ou compras governamentais –, representam parte significativa da economia internacional: cerca de 15% do PIB mundial. A adoção horizontal de critérios que privilegiem, por exemplo, a vida útil dos produtos, sua reutilização e reciclagem, a redução da emissão de poluentes tóxicos, o menor consumo de matérias-primas ou energia, ou que beneficiem pequenos produtores ou comunidades extrativistas, teria impacto significativo na promoção do desenvolvimento sustentável.
   A utilização de tais critérios de sustentabilidade social e ambiental nos procedimentos de contratações públicas poderia, ainda, favorecer a adoção de padrões sustentáveis de produção pelos agentes privados, criando mercado e garantindo escala para a implementação de novas tecnologias.
   Reconhecendo que as políticas de compras dos países são fruto de decisões soberanas, a Rio+20 poderia, no âmbito da discussão sobre Produção e Consumo Sustentáveis, incentivar iniciativas nacionais na área de compras públicas sustentáveis e promover a troca de experiências na matéria. A Conferência deve, ainda, conferir ímpeto político ao tema, afirmando-o como um princípio na administração pública. Nesse sentido, a Rio+20 pode constituir espaço para que os países apresentem planos nacionais de compras sustentáveis e para que seja promovida discussão do quadro conceitual para a inserção desses planos, assegurando as salvaguardas necessárias para sua execução de maneira transparente e não-discriminatória, de acordo com as respectivas legislações
nacionais.

P3. B. Classificações de Consumo e Eficiência Energética

   A Rio+20 poderá promover programas de etiquetagem de consumo e eficiência
energética, utilizados em vários países, entre eles o Brasil. A medida possibilita a agentes privados, notadamente os consumidores, avaliar e otimizar o consumo de energia/combustível dos equipamentos, selecionar produtos de maior eficiência em relação ao consumo e melhor utilizar os equipamentos, possibilitando economia nos custos de energia.
   A partir das diversas iniciativas nacionais de eficiência energética, muitas das quais voluntárias, poderia ser proposta no âmbito da Rio+20 a criação de uma iniciativa internacional multissetorial. Caberia analisar os padrões internacionais já porventura existentes a fim de verificar se podem constituir base adequada para o exercício.

P3. C. Financiamento de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento Sustentável

   Com o objetivo de qualificar recursos humanos de alto nível (nível técnico, graduação e pós-graduação) e apoiar projetos científicos, tecnológicos e inovadores, as bolsas de estudo e recursos para pesquisa, desenvolvimento e inovação, financiadas em grande parte com recursos públicos, têm um potencial de indução expressivo. Reconhecendo este potencial, os países poderiam, no âmbito da Rio+20, acordar o desenvolvimento sustentável e a economia verde inclusiva como temas prioritários para concessão de financiamento de ciência, tecnologia e inovação, com a possível adoção de um percentual-alvo de recursos para essas áreas.
   No âmbito dessa iniciativa, poderia ser considerada a criação de instituto, associado à Universidade das Nações Unidas, para realizar estudos sobre os rumos do desenvolvimento sustentável e o futuro comum da humanidade.

P4. Repositório de Iniciativas

   Embora sejam imprescindíveis novas pesquisas e soluções, muitas das tecnologias e práticas necessárias ao desenvolvimento sustentável já estão disponíveis. Há inúmeras experiências de sucesso nas áreas de desenvolvimento urbano, consumo sustentável, saúde, habitação, saneamento, eficiência energética, agricultura sustentável, entre outros. Entre erros e acertos, importantes lições foram aprendidas. Falta, no entanto, disseminar e dar escala a essas experiências.
  Um produto da Conferência poderia ser o estabelecimento de veículos próprios para disseminação de boas práticas, como um repositório das ideias e iniciativas empreendidas. Um repositório coligido por um secretariado internacional, se possível formado a partir de alguma organização já existente, poderia harmonizar e classificar informações sobre experiências de sucesso a serem apresentadas pelos países, de forma a facilitar sua utilização por outros países e mecanismos de cooperação internacional. O repositório poderia, por meio de diálogo entre o secretariado e os Estados-membros, examinar as condições que tornaram possível o sucesso de cada experiência, de modo a identificar as pré-condições para sua replicação bem sucedida e os fatores de singularidade que eventualmente não recomendariam sua reprodução.
   Haveria, portanto, foco nas características de viabilidade e poderia, igualmente, haver avaliação do potencial de integração da iniciativa com os programas existentes e as necessidades sociais de países que busquem replicá-la. O secretariado poderia ainda prestar assistência técnica aos países em desenvolvimento para a preparação de projetos e o desenvolvimento de estruturas de acompanhamento. As experiências assim coligidas serviriam para dinamizar os mecanismos nacionais e de cooperação internacional, inclusive a utilização de recursos dos organismos multilaterais, ao facilitar a preparação de projetos. A entidade responsável pelo repositório não seria, porém, ela mesma um financiador direto, a fim de evitar a distorção de seus objetivos pela expectativa dos beneficiários de acessar os recursos ou o controle do mecanismo pelos doadores.

P5. Protocolo Internacional para a Sustentabilidade do Setor Financeiro

O setor financeiro possui uma capacidade de indução e fomento singular na economia. Reconhecendo essa capacidade, diversas iniciativas nacionais e internacionais foram empreendidas nas últimas décadas com intuito de imprimir a adoção de padrões mais responsáveis do ponto de vista ambiental e social. No plano internacional, foram estabelecidos, em 2002, os “Princípios do Equador das Instituições Financeiras”, por iniciativa da Corporação Financeira Internacional (IFC), braço privado do Banco Mundial. Os Princípios do Equador servem de referencial para 72 instituições financeiras signatárias para identificação, avaliação e gestão de risco no financiamento

de projetos com desembolso superior a US$ 10 milhões.

No Brasil, os bancos públicos firmaram, em 1995, e atualizaram, em 2008, o protocolo de intenções denominado Protocolo Verde, assinado também pelos bancos privados em 2009, por meio da Federação Brasileira de Bancos. Mediante o Protocolo Verde, as instituições signatárias assumiram o compromisso de incluir a dimensão ambiental nos seus procedimentos de análise de risco e avaliação
 de projetos, bem como priorizar ações de apoio ao desenvolvimento sustentável. O desafio colocado para Rio+20 é ampliar e dar escala a essas experiências. A iniciativa brasileira do Protocolo Verde, cujo escopo é significativamente mais amplo que o dos Princípios do Equador, poderia servir de base para o lançamento de uma iniciativa mais abrangente, com compromisso de adoção pelos países.

P6. Novos Indicadores para Mensuração do Desenvolvimento

   A busca da plena realização do desenvolvimento sustentável deve ser orientada por uma clara compreensão das razões pelas quais esse conceito não foi levado à prática efetivamente nos últimos vinte anos. Uma das razões para tanto é que a implementação do desenvolvimento sustentável não foi dotada de meios suficientemente claros, práticos e mensuráveis. Assim, a realização do desenvolvimento sustentável acabou sendo percebida mais como custo do que como benefício, especialmente por ter sido identificada e associada como uma questão setorial apenas ambiental.
   As mais reconhecidas métricas de desenvolvimento são, basicamente, o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) e o Produto Interno Bruto (PIB). Tais métricas, como medida de desenvolvimento sustentável, são claramente limitadas, por não integrarem a grande diversidade de aspectos sociais e ambientais aos valores econômicos, induzindo a percepções errôneas do grau de desenvolvimento e de progresso dos países. O IDH constitui um avanço para indicar o “bem estar” dos povos, mas ainda é incompleto ao deixar de incluir questões associadas à escassez de recursos naturais e ao desenvolvimento econômico. Além disso, é uma iniciativa ainda periférica ao sistema econômico.
   Ao medir-se o desenvolvimento a partir de indicadores limitados, os agentes públicos e privados são direcionados, voluntaria ou involuntariamente, a ações que geram resultados igualmente imperfeitos.
   O Brasil apoia o estabelecimento de processo para adoção de novas formas de medida do progresso, que reflitam as dimensões ambiental, social e econômica do desenvolvimento. Esse processo deverá ter prazo para encerramento, com o engajamento de todos os atores relevantes, e deve ser construído com base nas experiências já existentes. O processo de revisão de métricas deverá ser cuidadoso, evitando a proposição de índices demasiadamente complexos, com muitos
componentes.


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