“Os nossos territórios estão constantemente ameaçados pelos grandes projetos,
como estradas, hidrelétricas, hidrovias, ferrovias e o agronegócio. Estes
projetos são projetos de morte para nossa Mãe Terra e para nós povos indígenas.
Por isto viemos pedir ao senhor, o amigo e defensor dos pobres, que peça ao
governo brasileiro que pare com todos os esses projetos genocidas”. O texto
integra a carta de jovens indígenas entregue ao
papa
Francisco.
A íntegra da carta é publicada pelo portal do
Cimi,
28-07-2013.
Eis a carta.
À Vossa Santidade o Papa Francisco
Nós lideranças indígenas do
estado do Tocantins, estamos muito felizes que o senhor esteja aqui no Brasil na
JMJ. Confiamos que sua visita será para o Brasil luz e
esperança nesta atual conjuntura.
Em nome de todos os 305 povos
indígenas do Brasil reconhecidos oficialmente, mas também, dos povos livres que
ainda se encontram nas florestas, nós jovens indígenas do Tocantins que viemos a
JMJ o cumprimentamos com respeito, admiração e
carinho.
Sabemos que o senhor é a liderança maior da Igreja
Católica, soubemos de todo o processo de sua eleição e acreditamos que Deus o
chamou para uma importante tarefa, de forma especial com os pobres e excluídos.
Não é a toa que o senhor escolheu para chamar-se “Francisco”, o irmão dos pobres
e da natureza.
Motivados e animados por esta simplicidade e seu
compromisso com os pobres e excluídos, viemos até o senhor, para pedir-lhe que
interceda pelos povos indígenas ante o governo brasileiro. Sua Santidade deve já
conhecer a situação que se vive no Brasil, principalmente pelos últimos
acontecimentos destes dois últimos meses, tudo como consequência das políticas
governamentais que só servem ao grande capital e as grandes empresas e esquece o
essencial: a vida, a justiça e a dignidade da população.
Nós
pedimos a sua Santidade, como liderança maior que peça ao governo brasileiro que
pare todos os ataques e violências que vem fazendo contra nosso povo indígena.
Nós povos indígenas só existimos com a Terra que é nossa Mãe, com o rio que é
nosso Pai, sempre vivemos em harmonia com a natureza, sem terra somos como uma
árvore sem raiz. Por isto, viemos pedir que peça urgentemente ao governo da
presidente Dilma Rousseff, que pare com o massacre contra nossos parentes,
principalmente com o povo indígena Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul, que
sofre por ter sido expulsado de sua terra que atualmente está em mãos dos
fazendeiros. Eles matam, criminalizam e acusam de bandidos e invasores aos povos
indígenas. Tal é o caso do povo Terena no estado do Mato Groso do Sul e do povo
Munduruku no estado do Pará, assim como, em outros povos, que por defender sua
terra lideranças tem sido assassinadas covardemente.
Todos os
conflitos se dão pelo direito a terra. E esse conflito o tem provocado e
fomentado o governo brasileiro com sua política indigenista que prioriza a
exploração e roubo de nossos territórios, transformando-o em mercadoria. Por
isto, nossas terras são cobiçadas por grandes empresas que querem explorar sem
piedade as riquezas de nossas matas. Nossa Terra é sagrada, é dom de Deus que
deu aos nossos antepassados e nós não vamos deixar que nenhum governo, nem
empresa tire de nós o que é nosso: a Terra.
Os nossos territórios
estão constantemente ameaçados pelos grandes projetos, como estradas,
hidrelétricas, hidrovias, ferrovias e o agronegócio. Estes projetos são projetos
de morte para nossa Mãe Terra e para nós povos indígenas. Por isto viemos pedir
ao senhor, o amigo e defensor dos pobres, que peça ao governo brasileiro que
pare com todos os esses projetos genocidas, como são a
Portaria 303 da AGU, as Propostas de
Emenda á Constituição (PEC)
038,
215 e
237, assim como também o
Projeto de Lei (PL) 1610 sobre a mineração.
Todos
eles são propostas para reduzir, manipular e acabar com os direitos indígenas
garantidos na Constituição Federal de 1988. Estas propostas colocam as terras
indígenas a mercê da exploração desenfreada, que só quer destruir e matar, sem
respeitar a nossa cultura, tradição e espiritualidade.
Peça ao
governo brasileiro também que cuide com carinho e atenção dos povos indígenas,
principalmente no tocante a saúde, pois muitas de nossas criancinhas, jovens e
anciões tem morrido por falta de atendimento básico. Pedimos que interceda por
nós para que o governo escute o clamor dos povos indígenas, dialogue com
respeito e respeite as nossas decisões, no tocante a nossos territórios. Que
respeite a Convenção 169 da OIT, e aceite a consulta, livre, previa e
informada.
Nós só queremos nossa terra, viver em paz e criar nossos
filhos e netos na terra que Deus nos deu. Queremos fazer nossas roças, pescar,
cantar e dançar, fazer nossos rituais e viver tranquilos, é só isso que
queremos, ou seja, queremos nosso Bem Viver, que significa viver bem com a
natureza e com as pessoas. Não queremos que nossos jovens continuem
suicidando-se por falta de seu território e por não ter o que oferecer aos seus
filhos.
Queremos dizer ao senhor que agradecemos a solidariedade da
Igreja Católica do Brasil à nossa luta e defesa de nossos direitos e o
compromisso à causa indígena.
Papa
Francisco, agradecemos que você não desistiu de vir ao Brasil neste
momento difícil, que não tem medo de ficar com os pobres, que significa para nós
ficar ao lado dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, camponeses e
excluídos da sociedade e defende-los dos grandes e poderosos.
Já
por último, queremos convidá-lo para que visite um dia nossa aldeia e veja a
riqueza de nossa cultura e a força de nossa espiritualidade e contemple a beleza
de nossa Mãe Terra.
Que Deus o ajude a defender a vida dos mais
pequenos e que nos ajude a todos a construir a Terra sem
Males.
Atenciosamente,
Jovens indígenas do Tocantins
– Brasil