A seguir postamos a quinta parte do “Documento de Contribuição Brasileira a Rio + 20”. Alguns temas deste documento são sugeridos para serem tratados dentro da questão do desenvolvimento sustentável na Rio + 20 como a biodiversidade. Vale ressaltar que a construção da sustentabilidade visa prioritariamente valorizar a pessoa humana e todo meio ambiente. Significa desenvolvermos no Brasil e em todo mundo uma economia sustentável. Construirmos uma comunidade local, um país sustentável é assegurar o direito e defesa da qualidade de vida para todos. Sociedades onde os seres humanos se preocupem e defendam prioritariamente sua espécie humana e todo ambiente.
Defender a biodiversidade é sem dúvida defender o direito dos povos indígenas e das populações tradicionais à posse da terra, respeitando-se a diversidade cultural do Brasil. Os povos indígenas e as populações tradicionais têm historicamente uma gestão sustentável das terras que habitam. Da mesma forma, defender o uso sustentável da água passa pela defesa das nascentes, rios e universalização do saneamento básico no Brasil. Em Minas Gerais – Brasil - estamos apoiando a luta pela criação do Parque Nacional da Serra do Gandarela. Uma região onde existem nascentes que abastecem a região metropolitana de Belo Horizonte.
Os temas do combate a pobreza e da economia verde serão tratados na Rio + 20. Que possamos no Brasil e no mundo avançarmos para a erradicação da pobreza em todos países e na conquista da justiça ambiental para todos.
O objetivo de postarmos este “Documento de Contribuição Brasileira à Rio + 20” é estimular a argumentação da sociedade civil. Qual é sua opinião ? Envie-nos seus comentários, textos artigos, matérias sobre a Conferência Rio + 20 e a Cúpula dos Povos que acontecerão no Brasil, no Rio de Janeiro em 2012.
PARTE V
20. Biodiversidade
Como em Mudança do Clima, não haverá negociação sobre biodiversidade na Rio+20. Do mesmo modo que a UNFCCC, a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica é o processo multilateral apoiado pelo Brasil. Entretanto, os temas de biodiversidade devem ser tratados no contexto do desenvolvimento sustentável. A conservação da biodiversidade, o uso sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados são medidas intrinsecamente ligadas ao desenvolvimento sustentável. Os índices recentes da perda de biodiversidade do planeta revelam a importância desse tema para todos os países.
A manifestação da biodiversidade na natureza é complexa, o que ressalta a importância da conservação sistêmica dos biomas terrestres e aquáticos. Nesse contexto, há que se reconhecer o inegável valor do estabelecimento de áreas protegidas como medida não só de conservação da biodiversidade, mas, também, de geração de emprego e renda, e de aumento da qualidade de vida da população.
A diversidade biológica está relacionada com sistemas de controle de enchentes, de doenças e pragas e de ciclos de nutrientes, essenciais para a manutenção da vida. Para assegurar o funcionamento desses sistemas, é fundamental garantir a sustentabilidade e a proteção de todos os biomas do planeta. No caso brasileiro, têm particular relevo a Amazônia, a Caatinga, o Cerrado, o Pantanal, a Mata Atlântica e o Pampa. Todos esses biomas demandam atenção apropriada e específica.
Estima-se que os países em desenvolvimento abrigam mais de 70% da biodiversidade do planeta, sendo que 20% do número total de espécies da Terra estariam no Brasil. O País abriga, ainda, uma rica sociobiodiversidade, representada por mais de 200 povos indígenas e comunidades tradicionais – caiçaras, seringueiros, quilombolas – verdadeiros mantenedores da biodiversidade. A valorização dos diferentes modos de vida contribui para a diversidade de respostas para o desafio do desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, os países em desenvolvimento, em especial o Brasil, assumem papel relevante nos esforços pelo desenvolvimento sustentável. O melhor aproveitamento dos referidos recursos de sua biodiversidade requer dos países em desenvolvimento investimentos em pesquisa e capacitação. Para tanto, considera-se imprescindível a cooperação internacional, com destaque para o fluxo adequado de financiamento público e privado, transferência tecnológica e capacitação proveniente dos países desenvolvidos. Ademais, oportunidades de cooperação Sul-Sul também merecem ser exploradas.
A economia de valoração da biodiversidade tornou-se um diferencial no mercado. Essa nova perspectiva econômica, elaborada a partir de elementos da biodiversidade, constrói um novo modelo que valoriza e quantifica os recursos naturais. Esse entendimento, que enfatiza o quanto os sistemas naturais fornecem bens e serviços à sociedade humana, está associado à noção de que esses sistemas são limitados, noção essa que ainda não faz parte do vocabulário da teoria econômica.
A valoração da biodiversidade não tem por objetivo mercantilizá-la ou financeirizá-la, mas atribuir-lhe valor para prevenção de dano, promover seu uso racional e sua conservação.
21. Combate à desertificação
Do mesmo modo que Mudança do Clima e Biodiversidade, a Rio+20 não é uma reunião negociadora sobre Desertificação, em virtude da existência de processo multilateral próprio, apoiado pelo Brasil, no âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre Combate à Desertificação. Entretanto, a Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação até hoje não logrou obter os resultados necessários para enfrentar os impactos ambientais, sociais e econômicos associados à desertificação. O reconhecido déficit de implementação da Convenção deve ser superado por um maior comprometimento ético e político dos países, traduzido sob novas formas de cooperação internacional para apoiar os que sofrem os efeitos da desertificação e da seca.
As regiões áridas e semi-áridas, com população de mais de um bilhão de pessoas,
concentram alguns dos mais altos níveis de pobreza do mundo. Nessas regiões, a base de recursos naturais tem sido frequentemente submetida à pressão predatória das atividades humanas que, em muitos casos, agravam os vetores de desertificação. Essas áreas são expostas a severa escassez de água e insegurança alimentar, e tornam-se mais vulneráveis aos impactos potenciais da mudança do clima.
A Rio+20 deverá, assim, constituir oportunidade para renovar o entendimento global em torno de objetivos e estratégias para dar ímpeto aos esforços internacionais de combate à desertificação, a degradação da terra e os efeitos da seca sob a perspectiva do desenvolvimento sustentável.
22. Água
O uso sustentável da água apresenta-se como um dos grandes desafios a serem
enfrentados tanto por países desenvolvidos, quanto por países em desenvolvimento. No presente contexto, as ações nacionais devem ser norteadas pelo aproveitamento mais adequado da água, de forma a favorecer sua conservação e a estimular o emprego de técnicas de tratamento e recuperação mais eficientes. Paralelamente, deve-se buscar a disseminação de políticas públicas que favoreçam o acesso de milhões de pessoas à água tratada.
Apesar de não haver foro internacional intergovernamental específico para tratar de recursos hídricos, o tema é amplamente discutido no âmbito das Nações Unidas e objeto de decisões, tais como as metas estabelecidas pela Agenda 21, a Declaração do Milênio e a Cúpula de Joanesburgo. O tema vem sendo amplamente discutido, no âmbito técnico e político, em foro internacional que congrega representantes de Governos, organizações não-governamentais, empresas privadas, usuários, instituições financeiras e cientistas.
A Rio+20 apresenta-se como oportunidade excepcional para estimular o debate
internacional sobre o uso sustentável da água, bem como sobre o desenvolvimento de possíveis mecanismos de coordenação do cumprimento das decisões e dos programas de monitoramento em curso no âmbito internacional. Além disso, a troca de experiências inovadoras e bem-sucedidas sobre o uso sustentável da água, levando-se em conta os três pilares do desenvolvimento sustentável, também poderia ser estimulada durante a Conferência.
23. Oceanos, mares e zonas costeiras
Nas últimas décadas, a preocupação de cientistas e conservacionistas se concentrou prioritariamente na proteção dos ecossistemas terrestres, entre outras razões, porque os impactos sobre tais ambientes eram mais facilmente observáveis. No entanto, de forma silenciosa e menos perceptível, zonas costeiras, mares e oceanos de todo o mundo vêm crescentemente sofrendo os efeitos da expansão da ocupação e dos usos humanos.
A gestão do território marítimo e costeiro requer uma abordagem integrada que leve em conta a incidência simultânea de vários fatores de pressão como urbanização, aproveitamento energético, turismo, pesca, dentre outros. O conhecimento e aproveitamento dos recursos do mar, vivos e não vivos, apresenta desafio técnico, científico e institucional. Para além do desafio para os países de promover a ocupação sustentável de suas Zonas Econômicas Exclusivas, extensas áreas oceânicas não estão sob jurisdição direta de nenhuma nação, o que não diminui o interesse e a responsabilidade compartilhada para seu conhecimento, exploração e conservação.
A ameaça da mudança do clima é particularmente preocupante na área costeira e marinha, com conseqüências de maior ou menor grau, a depender de vulnerabilidades locais e da intensidade dos fenômenos registrados. Impõem-se medidas de adaptação, de caráter eminentemente local, porém que demandam recursos e tecnologia que muitas vezes extrapolam as capacidades nacionais.
O Capítulo 17 da Agenda 21 Global, dedicado à proteção de oceanos, mares e zonas costeiras, foi extenso nas medidas a serem adotadas, mas vinte anos depois, ainda há muito que ser feito. O tema deverá ser abordado com especial atenção na Rio+20, e os problemas e oportunidades incidentes na região costeira e marinha necessitam ser considerados na perspectiva dos três pilares do desenvolvimento sustentável.
A Rio+20 deverá emitir claros sinais de prioridade para o tratamento multilateral dos oceanos, inclusive de aprimoramento da coerência do sistema, por meio de maior eficácia, transparência e capacidade de resposta do UN-OCEANS, mecanismo de coordenação das agências do sistema das Nações Unidas.
24. Pesca e aqüicultura
A superação dos conflitos pelo uso de recursos potencialmente escassos – solos
agricultáveis e água – passa pela valorização dos recursos aquáticos, mediante a racionalização da pesca e a expansão da aquicultura, sem esquecer o potencial energético das algas, que podem vir a ser importante matéria prima para a produção de bioenergia.
A Rio+20 deverá prover orientações para a adequada explotação dos recursos pesqueiros, num contexto onde a demanda global por recursos alimentares é crescente e se evidenciam sinais de sobreexplotação e esgotamento desses recursos.
A aquicultura tem importância estratégica para o desenvolvimento sustentável inclusivo, ao criar empregos, produzir proteínas de alto valor nutritivo e, dessa forma, contribuir para a eliminação da fome e da pobreza e para a segurança alimentar e nutricional, evitando o desmatamento e a degradação ambiental.
O apoio dos governos a formas sustentáveis de uso dos recursos pesqueiros como a pesca artesanal deve ser fortalecido, assim como deve ser estimulada a adoção de planos de manejo, zonas de exclusão pesqueira e unidades de conservação marinhas de uso sustentável, com o objetivo de manter a capacidade regenerativa dos oceanos e ecossistemas estuarinos.
Faz-se necessário dar voz e priorizar as populações tradicionais nos processos de
planejamento, construção e implementação de tais ações por seu histórico de uso e culturas ancestrais consolidados nesses territórios, no intuito de compatibilizar o aumento na produção pesqueira e aquícola com a preservação de formas tradicionais sustentáveis de uso dos oceanos e zonas estuarinas.
A utilização racional dos potenciais hídricos dos países requer a adoção de medidas inovadoras para a produção aquícola, para a preservação dos estuários e manejo dos organismos aquáticos como forma de produção sustentável de alimentos, geração de emprego, trabalho e renda. Essas medidas incluem, entre outras, a manutenção e recuperação dos estoques pesqueiros a níveis sustentáveis, bem como crescente transparência na gestão desses estoques, e o desenvolvimento de tecnologias cada vez mais avançadas de localização e captura do pescado e a valorização de espécies que anteriormente eram descartadas. Igualmente, a revisão aos subsídios que contribuem para a sobreexplotação pesqueira é particularmente importante na pesca oceânica, sem prejuízo do desenvolvimento da pesca, em base sustentável, por parte dos países em desenvolvimento com frotas incipientes.
25. Florestas
As florestas, distribuídas nas mais diversas regiões do planeta, desempenham
importantes funções, sejam elas sociais, econômicas ou ambientais. Ofertam uma variedade de bens, como produtos florestais madeireiros e não madeireiros, além de prestarem serviços ambientais essenciais, como a conservação dos recursos hídricos e do solo, a conservação da biodiversidade e a estabilidade climática. Possuem valores culturais de importância fundamental para o desenvolvimento social e a erradicação da pobreza.
O manejo responsável de todos os tipos de florestas, para a produção sustentável de bens e serviços, constitui um desafio e uma oportunidade para toda a sociedade, pois se trata de uma fonte para a produção de matérias-primas e de biomassa para geração de energia, além de importante ferramenta para conservação da floresta e geração de trabalho decente.
No plano internacional, a manutenção das florestas ganha ainda mais destaque, a partir dos avanços nas Convenções das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e sobre Diversidade Biológica, nas quais a redução das emissões de carbono, a conservação da biodiversidade e a repartição de benefícios provenientes do patrimônio genético ganham destaque. O Brasil em especial tem sido proativo na liderança de propostas sob as duas Convenções.
Sem colidir com as Convenções específicas, a Rio+20 poderá ter um papel relevante ao enfatizar a valorização das florestas na economia dos países, tanto para preservação dos serviços ambientais quanto para seu uso econômico, proporcionando a geração de bens e serviços, mitigação da mudança do clima e, sobretudo, inclusão social. Esse reforço é fundamental frente à pressão que outras atividades predatórias exercem sobre as áreas florestais, gerando um ciclo vicioso de empobrecimento econômico, social e ambiental.