A qualidade da água potável distribuída em Belo Horizonte é a terceira pior entre 16 capitais brasileiras analisadas em uma pesquisa inédita no Brasil, realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A reprovação é no aspecto de concentração de cafeína.
A presença dela na água que vai para o consumidor significa que o tratamento não foi 100% eficaz e que outras substâncias ou esgoto podem não ter sido totalmente eliminados no processo de tratamento. A situação é pior em São Paulo e Porto Alegre.
O estudo, do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA), do Instituto de Química (IQ) da Unicamp, revela que as substâncias encontradas, além da cafeína, são “potencialmente nocivas” à saúde humana. Isso significa que não é para se fazer
alarde, mas as companhias de saneamento precisam ter atenção e melhorar os processos de tratamento.
Estudioso da qualidade das águas em Minas, o professor Robson Afonso, do Instituto de Ciências Exatas e Biológicas (Iceb) da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), explica que, se há cafeína, quer dizer que chá ou café foram parar no reservatório de abastecimento. E isso, segundo ele, só pode ter acontecido via fezes ou urina, evidenciando que o tratamento do esgoto não foi eficiente.
Além de cafeína, os cientistas da Unicamp encontraram, em todas as amostras do Sudeste brasileiro, concentrações variadas de atrazina, substância presente em herbicidas, e de triclosan, usada na fabricação de produtos de higiene pessoal.
“A detecção desses compostos na água potável causa preocupação, pois eles começam a se apresentar em concentrações elevadas e o ser humano tem ficado mais exposto”, observa o coordenador do estudo e do Laboratório de Química Ambiental (LQA) do IQ, Wilson de Figueiredo Jardim. “Essa é a prova clara de que os mananciais estão comprometidos e que as estações de tratamento não dão conta de remover esses poluentes”, acrescenta.
Em BH, as piores amostras saíram dos mananciais dos rios Paraopeba, Morro Redondo e das Velhas. Esse último foi citado no Mapa da Qualidade das Águas 2011, do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), como um dos mais poluídos do Estado e registrou, no estudo da Unicamp, o índice mais alto de contaminação por cafeína: dez vezes maior que o dos outros dois rios.
As amostras foram recolhidas dos canos de entrada de água de residências e locais públicos, garantindo que saíram diretamente da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Todas as amostras continham cafeína.
Segundo Wilson Jardim, São Paulo, Porto Alegre e BH tiveram as amostras com mais concentração de cafeína porque estão no interior do país e o descarte do esgoto se dá nos mananciais. Já nas capitais costeiras, isso é feito nos oceanos.
Nas amostras, foram encontrados ainda hormônios sintéticos e naturais, como o estrógeno, que pode provocar mudanças no sistema endócrino de homens e mulheres. “Uma hipótese, que carece de mais estudos, considera que esse tipo de contaminação poderia estar contribuindo para que a primeira menstruação ocorra cada vez mais cedo nas meninas”, diz Wilson Jardim. A pesquisa completa ainda será publicada como tese de doutorado dele, por isso não revela os índices das substâncias encontradas.
As outras 13 capitais estudadas são Goiânia, Palmas, Natal, Porto Velho, Cuiabá, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Rio de Janeiro, Vitória, Recife e João Pessoa. ( Fonte: Projeto Manuelzão - Izabela Ventura - Hoje em Dia)