Neste ano crucial para a humanidade, agora é o momento de
agir de forma ousada para proteger o clima.
Estamos à beira do abismo. Os últimos seis anos, desde
2015, foram os mais quentes já registrados. 2020 foi 1,2 grau Celsius mais
quente do que os tempos pré-industriais, já que as concentrações dos principais
gases do efeito estufa continuaram a subir e as concentrações de dióxido de
carbono atingiram um novo máximo - 410,5 partes por milhão.
O número de ciclones tropicais em todo o mundo ficou acima
da média no ano passado, incluindo 98 tempestades. No Ártico, a extensão mínima
anual do gelo marinho em setembro foi a segunda menor já registrada. A perda de
gelo da Antártica aumentou. No Brasil, a seca gerou graves incêndios florestais
no Pantanal.
A ciência é irrefutável e mundialmente consensual: para
impedir que a crise climática se torne uma catástrofe permanente, devemos
limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius.
Para fazer isto, devemos chegar à emissão zero de gás
carbônico até metade do século. Os países que representam cerca de dois terços
da economia global já se comprometeram a isto. É um cenário encorajador, mas
precisamos urgentemente que todos os países, cidades, empresas e instituições
financeiras se unam a esta coalisão e adotem planos concretos para a transição
de neutralidade de carbono.
É ainda mais urgente que os governos combinem esta ambição
de longo prazo com ações concretas e imediatas, à medida que são mobilizados
trilhões de dólares para superar a pandemia da COVID-19. A revitalização das
economias é a nossa oportunidade de redesenhar o nosso futuro.
O mundo tem uma abordagem forte para a ação: o Acordo de
Paris, no qual todos os países se comprometeram a incluir seus próprios planos
nacionais de ação climática e a fortalecê-los a cada cinco anos. Mais de cinco
anos depois, e com a prova condenatória de que se não agirmos nós destruiremos
o nosso planeta, é hora de uma ação decisiva e efetiva, já que as Nações Unidas
convocam todos os países para a COP26 em Glasgow, em novembro.
Os novos planos nacionais devem cortar a poluição mundial
de gases de efeito estufa em pelo menos 45 por cento até 2030 em relação aos
níveis de 2010. Muitos já foram apresentados e estabelecem políticas mais
claras para a adaptação aos impactos das mudanças climáticas e promoção do
acesso à energia renovável.
No entanto, até agora, estes planos alcançaram uma redução
de menos de um por cento nas emissões. Isto é verdadeiramente um alerta
vermelho para as pessoas e para o planeta.
Nos próximos meses, começando pela Cúpula de Líderes
organizada pelos Estados Unidos, os governos devem intensificar drasticamente
as suas ambições - principalmente os países que mais emitem e que são os
principais causadores desta crise. Estou ansioso por uma ambição significativa
do Brasil na Contribuição Nacionalmente Determinada do país, incluindo a
contenção do desmatamento e, ao mesmo tempo, a garantia de apoio e criação de
empregos em regiões-chave.
A eliminação gradual do carvão no setor energético é a
etapa mais importante para atingir a meta de 1,5 grau Celsius. A ação imediata
para remover o combustível fóssil mais sujo e mais poluente do setor de energia
oferece ao nosso mundo uma oportunidade de lutar.
A utilização mundial de carvão na geração de eletricidade
deve ser reduzida em 80% até 2030, em relação aos níveis de 2010. Isto
significa que as economias desenvolvidas devem comprometer-se a eliminar o
carvão até 2030 e os outros países devem fazer isto até 2040. Não há razão
nenhuma para que sejam construídas novas centrais de carvão. Um terço das
centrais de carvão já custa mais para operar do que construir novos parques e
armazéns de energias renováveis. A COP26 deve assinalar o fim do carvão.
Enquanto o mundo se move para a energia renovável e o ar
puro, é essencial garantirmos uma transição justa. Os trabalhadores das
indústrias impactadas e dos setores informais devem ser apoiados enquanto mudam
de emprego ou ganham novas competências. Devemos também liberar o grande poder
das mulheres e das meninas em fazer a transformação, incluindo-as como
participantes iguais na governança e na tomada de decisões.
Os países que contribuíram menos com as mudanças climática
estão sofrendo os piores impactos. Muitas pequenas nações insulares
simplesmente deixarão de existir se não acelerarmos a resposta. Os países
desenvolvidos devem cumprir os seus compromissos fornecendo e mobilizando 100
bilhões de dólares anualmente para: dobrar os níveis atuais de financiamento
climático; destinar metade de todo o financiamento internacional do carvão; e
mudar os subsídios dos combustíveis fósseis para as energias renováveis.
A Cúpula do G7, em junho, oferece uma oportunidade para os
países mais ricos do mundo avançarem e apresentarem os comprometimentos
financeiros que garantirão o sucesso da COP26.
Enquanto governos devem liderar, os tomadores de decisão
de todo o mundo têm um papel vital a desempenhar.
Peço a todos os bancos multilaterais e nacionais de
desenvolvimento que, até a COP26, adotem políticas claras para financiar a
recuperação da COVID-19 e a transição para economias resilientes nos países em
desenvolvimento, levando em consideração os níveis devastadores de dívidas e as
imensas pressões nos orçamentos nacionais.
O setor financeiro no Brasil deu passos importantes. O
Banco Central lançou uma agenda de sustentabilidade e está integrando os riscos
climáticos ao seu trabalho. Atores financeiros privados como Itaú, Santander e
Bradesco traçaram planos para impulsionar o desenvolvimento na Amazônia por
meio de cadeias de suprimentos sustentáveis, investimentos em infraestrutura e
apoio aos agentes locais na bioeconomia. A associação de bancos comerciais do
país tem sido fundamental para o avanço das recomendações da Força-Tarefa sobre
Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima.
Muitos governos locais e empresas privadas se
comprometeram com a neutralidade de emissões até 2050 e estão determinados a
fazer revisões significativas de seus modelos de negócios. Apelo a todos que
definam metas e políticas ambiciosas.
Gostaria também de encorajar os jovens de todo o mundo
para que continuem a levantar as suas vozes exigindo ação para combater as
mudanças climáticas, proteger a biodiversidade, acabar com a guerra da
humanidade contra a natureza e acelerar os esforços para alcançar os Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável.
O tempo está acabando e há muito trabalho duro pela
frente, mas não é hora de levantar a bandeira branca. As Nações Unidas
continuarão a levantar nossa bandeira azul de solidariedade e de esperança.
Neste Dia da Terra, 22 de abril, e nos cruciais meses à frente, apelo para que
todas as nações e todas as pessoas se levantem juntas neste momento.