quinta-feira, 5 de maio de 2016

SOCOLOGIA AMBIENTAL - artigo de ELENA STEINHORST DAMASCENO

   SOCIOLOGIA E MEIO AMBIENTE


SOCIOLOGIA AMBIENTAL: um campo de pesquisa em consolidação

  Elena Steinhorst Damasceno
 ( PRIMEIRA PARTE) 

 RESUMO: este artigo tem por objetivo fazer uma breve revisão sobre as pesquisas em Sociologia Ambiental. São utilizadas como referências principais Buttel (1978), Hannigan (2009), Herculano (2000), Ferreira (2002, 2004), Mol e Spaargaren (2005), Lenzi (2005, 2007), Guivant (2005) e Moraes (2005) dentre outras que juntas formam o estado da arte sobre o tema. A Sociologia Ambiental como um campo de pesquisa é uma área relativamente nova da Sociologia e se encontra em fase de consolidação. Possuindo uma diversidade de orientações teóricometodológicas em disputa, enfrenta o desafio epistemológico da “transposição disciplinar” e da “divisão homem-natureza”. Tendo em vista a emergência da crise ambiental, observa-se, por meio desta revisão, o avanço monumental da “subdisciplina” nas últimas décadas e a diversidade de abordagens que nela cabem.

 INTRODUÇÃO

 O objetivo inicial deste artigo é fazer uma breve revisão sobre as pesquisas em Sociologia Ambiental. São utilizadas como referencias principais Buttel (1978), Hannigan (2009), Herculano (2000), Ferreira (2002, 2004), Mol e Spaargaren (2005), Lenzi (2005, 2007), Guivant (2005) e Moraes (2005) dentre outras que juntas formam o estado da arte sobre o tema. Primeiramente, a Sociologia Ambiental como um campo de pesquisa é uma área relativamente nova da Sociologia, que se encontra em fase de consolidação, possuindo uma diversidade de orientações teórico-metodológicas em disputa. Ferreira (2002, p. 1) afirmava que o número de pesquisas científicas sobre a interrelação entre a sociedade e o ambiente estava aumentando rapidamente em todo o mundo, o que era confirmado pela crescente proliferação de contribuições das mais diversas áreas de especialização: o que foi chamado, genericamente, de "problemas ambientais" tornou-se importante preocupação, embora restrita a determinados grupos, segundo a autora. Para Herculano (2000) a Sociologia Ambiental seria uma subdisciplina integradora, que já nasceu fecunda e resultante de múltiplas inspirações.

  A  SOCIOLOGIA AMBIENTAL EM CONSTRUÇÃO 

    Segundo Herculano (2000, p. 2), em referência a Buttel (1996), a Sociologia Ambiental não seria “tão nova”, se tivermos por parâmetro um amálgama de áreas e “subdisciplinas” já sedimentadas há décadas. Entre essas, que teriam contribuído para a formação da sociologia ambiental contemporânea, estaria a Ecologia Humana, que surgiu como estudo da mudança entre o rural e o urbano, porém, “nunca chegou a dar importância aos fatores ambientais em sentido estrito”, “tratava de ver como o meio físico da cidade atuava no comportamento das pessoas” e “criava uma cultura específica e estava limitada ao foco da cooperação competitiva na organização espacial de populações metropolitanas”. Outra subdisciplina contribuinte é a Sociologia Rural que, segundo a autora, seria embasada na geografia e na antropologia econômicas, mas estudaria as “comunidades diretamente dependentes de recursos naturais”, tais como pescadores, extrativistas, agricultores, lavradores, etc. A Sociologia dos Recursos Naturais seria mais uma que, “estudando a gestão do meio ambiente, este entendido enquanto recursos naturais”, abarcaria os estudos sobre política de terras públicas, planejamento de usos da terra, a gestão das unidades de conservação, incluídos parques e áreas de lazer. Herculano (2000, p. 3) acrescenta à lista de subdisciplinas, sugerida por Buttel, que teriam contribuído para a formação da Sociologia Ambiental, a Psicologia Social e a Antropologia Cultural, “com estudos sobre atitudes e valores”; a Sociologia dos Movimentos Sociais, “enfocando novos sujeitos coletivos, suas agendas de lutas e os conflitos dos diversos agentes sociais”; a Sociologia do Desenvolvimento, “esta última na sua vertente marxista, questionadora do mito do desenvolvimento”; e a Sociologia Urbana, “sobre o meio ambiente construído”.

    Hannigan (2009, p. 15), em seu livro Sociologia Ambiental, trata da “chamada subdisciplina” em termos de uma retrospectiva quanto ao pensamento na área, assim como da sociologia ambiental enquanto campo de pesquisa. O autor delimita o “Dia da Terra”, manifestação ambientalista nos EUA que culmina com a criação da Agencia de Proteção Ambiental, a primeira do país, como marco que inicia o que o autor chama de “década ambiental”, nos anos 1970. 

  Herculano (2000, p.3-4) aponta que, no final da década de 1970, a seção sobre Sociologia Ambiental da ASA (Associação Norte-Americana de Sociologia) já contava com 321 membros. Após um breve declínio nos anos 1980, a Sociologia Ambiental norte-americana e mundial se revitalizam, proporcionalmente ao aprofundamento em relação à percepção dos problemas ambientais:

  em lugar da degradação ambiental ser percebida como um problema estético, passou a ser vista como ameaça à saúde e ao bem-estar e enquanto um risco tecnológico (o lixo tóxico em Love Canal, os acidentes nucleares de Three Mile Island, de Bhopal e de Chernobyl, a descoberta da destruição progressiva da camada de ozônio, tudo isso passou a ser visto como indícios de ameaças definitivas à sobrevivência humana e planetária). Nos anos 90, finalmente, a questão ambiental passou a ganhar uma dimensão mais complexa e uma institucionalidade global. A partir da realização da Conferência da ONU para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992 (CNUMAD ou UNCED), foi criada a Comissão para o Desenvolvimento Sustentável, na ONU, e um Fundo Geral para o Meio Ambiente - GEF. As alterações climáticas causadas pela produção humana passaram a ser definidas como a grande questão ambiental ("global environmental change"- GEC). Comissões e grupos de estudos acadêmicos e intergovernamentais têm sido formados desde então, aproximando cientistas naturais e sociais, para se ganhar entendimento sobre as dimensões humanas das alterações climáticas e do aquecimento global.

    Guivant (2005, p.11) afirma que Catton e Dunlap foram pioneiros na Sociologia Ambiental, tendo inclusive cunhado o termo: 

   Mas eles também abriram dentro da incipiente Sociologia Ambiental o debate entre posições realistas e construtivistas sociais que, apesar de nem sempre acontecer de forma explícita, atravessa a Sociologia Ambiental. Os realistas, dentro dos quais Catton e Dunlap se situavam, defendem a existência objetiva dos problemas ambientais, independentemente da forma em que os atores sociais os percebem. A crítica construtivista foi realizada por Frederick Buttel (1978), que passaria a ser um dos mais destacados sociólogos ambientais.

     Hannigan (2009) entende que o “conflito construcionista-realista” teve mais recentemente seu tom moderado entre os sociólogos ambientais, que foram à procura de alguma síntese entre variadas perspectivas. Mas, Ferreira (2005, p.78), por outro lado, afirma que:

   A sociologia ambiental, enquanto produção científica e acadêmica, emergiu a reboque dos movimentos de contestação social surgidos no início dos anos 60 e da constatação da situação emergencial de degradação dos recursos naturais e do desenvolvimento do industrialismo. O nascimento do movimento na década de 1960 surpreendeu os sociólogos, que naquele momento não dispunham de um corpo teórico ou tradição empírica que os guiasse em direção ao entendimento da relação entre sociedade e natureza. Os pioneiros da sociologia clássica (Durkheim, Marx e Weber) tinham abordado a questão de modo tangencial; além disso, apenas raramente surgiam trabalhos isolados, sem, no entanto, promover uma acumulação considerável de 4 conhecimento que permitisse a criação de um campo teórico. Existem várias hipóteses para o entendimento deste processo (grifo nosso).

    Segundo HANNIGAN (2009), o que se tinha eram trabalhos isolados dentro da subárea da sociologia rural, porém, para compreender a emergência da sociologia ambiental, é necessário observar como as teorias geográficas e biológicas do desenvolvimento social perderam força quando a sociologia surgiu, no início do século XX, como disciplina distinta. O autor aponta, citando Buttel (1986), que a dimensão ambiental já estava implícita desde os trabalhos clássicos de Durkheim, Marx e Weber, contudo nunca foi evidenciada pelo fato da explicação da estrutura social ser favorecida em detrimento às explicações físicas ou ambientais (HANNIGAN, 2009, p.15). Em concordância com Hannigan, Ferreira (2004, p. 80) afirma: 

  (...) O que atualmente é identificado como preocupação ambiental seria visto como atraso e obstáculo ao desenvolvimento, ao progresso. Certamente havia críticos ao paradigma desenvolvimentista, como os sociólogos marxistas; mas, estes tendiam a ver a problemática ambiental como um desvio das questões cruciais do humanismo. Buttel (1992), por sua vez, assinala o relacionamento ambíguo da sociologia, em sua fase de construção, com as ciências naturais. Se, de um lado, o pensamento sociológico foi influenciado por conceitos provenientes das ciências naturais, por outro lado, a própria necessidade de legitimação das ciências sociais exigiu uma reação contra a simplificação das explicações oriundas do determinismo biológico e geográfico, conforme mencionado anteriormente.

    Para Lenzi (2007, p.1) a proposta de criação de uma Sociologia Ambiental nasceu de uma forte crítica às sociologias clássica e contemporânea:

  Essa crítica emergiu ao final da década de 70, quando os cientistas sociais americanos Catton e Dunlap (1978) criticaram justamente a ausência de qualquer preocupação com as pré-condições ecológicas da sociedade nos estudos sociológicos. Segundo estes autores, esta ausência não era apenas casual, mas indicava a existência de um paradigma antropocêntrico existente na Sociologia que teria emergido com o nascimento da Sociologia moderna. A idéia de que os clássicos da Sociologia não nos legaram uma sensibilidade ecológica não está restrita ao trabalho de Catton e Dunlap (1978), mas tende a receber um apoio nas avaliações de cientistas sociais contemporâneos.

   Lenzi (2007) retoma a discussão analisando algumas idéias de Durkheim, Weber e Marx, buscando identificar os limites e possibilidades que as obras desses autores podem oferecer para a Sociologia Ambiental. Argumenta que a herança deixada por estes clássicos da Sociologia é marcada por uma ambivalência com relação à problemática ambiental e que isso está relacionado com a forma pela qual a Sociologia veio a ser definida em suas obras. Ele alega que problemas associados com a herança sociológica clássica têm implicações para pensar a condição teórica da própria Sociologia Ambiental.  

  Para Ferreira (2002, p. 1), as ciências sociais, a despeito de outras áreas do conhecimento, em relação aos problemas ambientais, atribuem à sociedade o paradigma dominante da fé no progresso e na racionalidade humana:

   Marx (1980), bem como Durkheim (1995) vê a era moderna como turbulenta, mas ambos acreditam que os possíveis benefícios fornecidos pela era moderna superam seus aspectos negativos. Weber (1982) foi o mais pessimista dos três, vendo o mundo moderno como um paradoxo onde o progresso material foi obtido apenas à custa da expansão burocrática que esmagou a criatividade e autonomia individual. No entanto, nem mesmo ele antecipou completamente o quão extenso se tornaria o lado escuro da modernidade. Ambos os cientistas naturais e sociais construíram suas teorias em duas premissas básicas: o modelo newtoniano e dualismo cartesiano, segundo a Comissão Gulbenkian (1996). (FERREIRA, 2002, p. 1, tradução nossa).

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