segunda-feira, 30 de maio de 2016

SOCIOLOGIA AMBIENTAL por ELENA STEINHORST DAMASCENO

  







   Visando estimular a produção de conhecimentos na área de sociologia e meio ambiente, postamos a terceira parte do artigo de Elena Steinhorst Damasceno. Nossos agradecimentos a Elena Steinhorst. 


SOCIOLOGIA AMBIENTAL: um campo de pesquisa em consolidação  - parte 3

Elena Steinhorst Damasceno   


Epistemologia na sociologia Ambiental

 Moraes (2005, p. 46-47) alerta para a importância da epistemologia no trabalho científico, principalmente devido ao fato da problemática ambiental “ser arredia aos paradigmas tradicionais” e delimita três aspectos que devem ser observados para a pesquisa na temática ambiental: a identificação clara e precisa do universo de análise, ou seja, uma localização filosófica dos fenômenos e relações que buscamos na investigação empírica; a delimitação metodológica, ou escolha do método mais apropriado no universo das ciências sociais; e a procura de uma linguagem comunicante, tendo em vista as diferentes áreas disciplinares que podem estar contempladas na temática ambiental.
   O autor refere-se ainda à necessária anterioridade da reflexão metodológica ante a investigação empírica, tendo em vista que no trato da questão ambiental as barreiras metodológicas podem ser um empecilho tão significativo como a transposição disciplinar4 . A problematização de cunho ético é colocada como situação limite do campo epistemológico, tendo em vista a emergência das políticas ambientais e conseqüente demanda direcionada as universidades brasileiras, no sentido de elaboração de peças técnicas para os grandes projetos de desenvolvimento (MORAES, 2005). Dentre algumas das posturas éticas possíveis, como o chamado naturalismo, tecnicismo e romantismo5 , observa-se a postura crítica6 em relação à pesquisa e diante da problemática ambiental.
   Segundo Hannigan (2009) a dicotomia homem-natureza deve ser superada e qualquer tentativa nova na perspectiva da sociologia ambiental necessita confrontar a “divisão sociedade-natureza”. Destaca a emergência de novos esforços para as relações de análise socioambiental e percebe o desafio de reconciliar o macro com os dados mais particularizados de análise. O autor sugere a “teoria da emergência” como moldura para as análises dos problemas ambientais futuros (HANNIGAN, 2009, p. 216). Moraes também dá destaque a isso e enfatiza “a natureza para o homem” em Marx, como opção filosófica de romper tal dicotomia (MORAES, 2005, p. 72-73).
     Hannigan (2009) relaciona a Ciência, cientistas e problemas ambientais e mostra a ligação entre problema ambiental e pesquisa científica, problematizando o papel dos pesquisadores na formulação de argumentos para a questão ambiental, porém, por outro lado, afirma que há um grande campo de incertezas na ciência. O autor discute esse tema e sua relevância para a construção de novos problemas ambientais e seu anúncio para o mundo, exemplificando o problema da chuva-ácida e da perda de biodiversidade, e a importância da ciência na formulação de políticas públicas ambientais, afirmando que: “Finalmente, é a estrutura de apoio científico destes problemas ambientais que os sustentam acima dos outros problemas sociais que são mais dependentes de argumentos de bases morais” (HANNIGAN, 2009 p.141 apud YAERLEY, 1992, p. 117).

   Pesquisas atuais em Sociologia Ambiental

   Segundo Herculano, no âmbito acadêmico, a Associação Internacional de Sociologia (ISA) fundou, em 1990, um novo comitê de pesquisa, o RC/24 (Meio Ambiente e Sociedade), constituído por egressos de estudos da Ecologia Humana, da Sociologia Urbana, da Sociologia Rural, entre outras. No Brasil, a Associação  Nacional de  Pesquisadores em Ciências Sociais (ANPOCS) criou, igualmente, um grupo específico para a temática ambiental, o GT/04 (Ecologia e Sociedade). Assim, diversos programas de pós-graduação no Brasil passaram a se dedicar à temática ambiental, “alguns deles com uma ambição multi ou transdisciplinar” (HERCULANO, 2000, p.4).
    No ano de 2002 foi criada a ANPPAS, Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade, com a participação de diversas instituições7 brasileiras de ensino e pesquisa, com formação strictu sensu de pessoal especializado em nível de pós-graduação, de caráter interdisciplinar e que focalizam a interação Ambiente e Sociedade em suas múltiplas dimensões.  A ANPPAS promove reuniões científicas, objetivando o intercâmbio de informações entre seus associados e de associações similares brasileiras, estrangeiras ou internacionais, promovendo a divulgação de estudos em Ambiente e Sociedade, publicações, concursos e premiações (ANPPAS).
    Percebemos, assim, o avanço monumental da Sociologia Ambiental de forma geral e a diversidade de abordagens que nela cabem. Após a leitura dos autores citados neste texto, percebe-se certa tendência “modernizadora” nos trabalhos em Sociologia Ambiental no Brasil, por um lado, com inspiração nos grupos de pesquisa da Holanda, Canadá e Estados Unidos, verificado principalmente os grupos de pesquisa em Sociologia Ambiental da UFSC e Unicamp. De outro lado, nota-se que outros grupos seguem perspectiva divergente, apoiando-se mais nos estudos de Conflitos Ambientais, Movimentos Sociais e Ecologia Política, ainda com uma forte interface Antropológica, como é o caso do GEDMMA (UFMA)8 , que mantém afinidade com o IPPUR9 (UFRJ) e GESTA10 (UFMG).
_______________________________________
Participaram da criação, na sede do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo - PROCAM/USP o Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Estadual de Campinas - NEPAM/UNICAMP; o Núcleo de Altos Estudos Amazônicos- Universidade Federal do Pará - NAEA/UFPa; o Centro de Desenvolvimento Sustentável - Universidade de Brasília - CDS/UnB; o CPDA/Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; o Programa de Pós - Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas/Universidade Federal de Santa Catarina; o Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento/Universidade Federal do Paraná; o Programa de Mestrado em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo - PROCAM/USP e o Programa Regional de Pós Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA. (fonte: sítio ANPPAS na internet, ver ref.). 8 Grupo de Estudos Desenvolvimento Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA/UFMA). Sítio eletrônico: http://www.gedmma.ufma.br/ 9 Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano Regional (IPPUR/UFRJ) 10 Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA/UFMG)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

   Por fim, a Sociologia Ambiental pode ser vista como um campo de pesquisa em expansão, no qual a emergência da crise ambiental permite uma grande variedade de abordagens teórico-metodológicas e um crescente volume em produção acadêmica11 . Porém, são observados muitos trabalhos recentes com a característica de simples junção de dados biológicos com análises sociológicas, como tentativa de fazer uma Sociologia Ambiental. Tal postura deveria ser revista, tendo em conta as análises sobre a “divisão homem-natureza”, que são refletidas na “transposição disciplinar”. Ou seja, superar a esta dicotomia não significaria “colar uma coisa na outra” e sim procurar um método menos antropocêntrico possível. Sempre que necessário, a percepção biológica da natureza deveria ser acionada, porém, participando do contexto da “entre ajuda” transdisciplinar, tão cara à questão ambiental. 


REFERÊNCIAS:

ANPPAS. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade. http://www.anppas.org.br/novosite/index.php?p=oque Acesso dia 12/03/2013.
BUTTEL, F. Environmental Sociology: a new paradigm? The American Sociologist, 13 1978: p. 252-256.
 BUTTEL, F. H. Environmental and Resource Sociology: theoretical issues and opportunity for synthesis. Rural Sociology 61 (1), 1996, pp. 56 - 76.
CARSON, R. Silent Spring. Boston, MA: Roughton Mifflin, 1962. CATTON, W. R. Jr.; Riley E. DUNLAP. Paradims, Theories and the Primacy of the HEP-NEO distinction. The American Sociologist 13, 1978, p. 256 - 259.
 FERREIRA, Leila. C. Brazilian Environmental Sociology: a provisional review. Ambiente & Sociedade - Ano V – Nº 10 – 1º Semestre de 2002, p.1-11.
 FERREIRA, Leila. C. Idéias para uma sociologia da questão ambiental teoria social, sociologia ambiental e interdisciplinaridade. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Nº 10, p. 77-89, jul./dez. 2004. Editora UFPR.
FERREIRA, Lúcia da Costa. Conflitos sociais e uso de recursos naturais: breves comentários sobre modelos teóricos e linhas de pesquisa. Política e Sociedade Nº 7 outubro de 2005, p. 105-118. 11Para mais referências: Guia para o Iniciante em Sociologia do Meio Ambiente (MCREYNOLDS, 1999).
 GUIVANT, Julia S. Apresentação do Dossiê Mapeando os caminhos da Sociologia Ambiental. Política e Sociedade Nº 7 outubro de 2005, p. 9-25.
 HANNIGAN, John. Sociologia ambiental. Tradução de Annahid Burnett. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. 270p.
HERCULANO, Selene. Sociologia Ambiental: Origens, Enfoques Metodológicos e Objetos. Revista Mundo e Vida: alternativas em estudos ambientais, ano I, nº 1, UFF/PGCA - Riocor, 2000, pp. 45 –  Acesso em 11/03/2013. http://www.professores.uff.br/seleneherculano/images/stories/SOCIOLOGIA_AMBIENTAL_ORGENS_ENFOQUES_METODOLGICOS.pdf

INKELES, A.; SMITH, D. H. Becoming modern: individual change in six develomping countries. Cambrige, MA: Havard University Press, 1974.
 LENZI, Cristiano Luis. Sociologia Ambiental e a controvérsia sobre os Clássicos. Trabalho apresentado no XIII Congresso Brasileiro de Sociologia 29 de maio a 01 de junho de 2007, UFPE, Recife (PE) GT23: Sociedade e Ambiente, Coordenado por Horácio A.de Sant'ana Júnior (UFMA), Neide Esterci (UFRJ), Maria José da Silva Aquino (UFPA).
 LENZI, Cristiano Luis. Sociologia Ambiental: risco e sustentabilidade na modernidade. Bauru, SP: Edusc, 2006. 216p.
 MAY, Peter H. Mecanismos de mercado para uma economia verde. ECONOMIA VERDE: Desafios e oportunidades. Nº 8, Junho 2011. p. 170-178 Acessado em 25/04/2013. http://www.conservation.org.br/publicacoes/files/P%E1ginas%20de%20PoliticaAmbien tal08may.pdf
MCREYNOLDS, Samuel A. Guia para o Iniciante em Sociologia do Meio Ambiente: definição, lista de jornais e bibliografia. Ambiente & Sociedade - Ano II – Nº 5 – 2º Semestre de 1999. P. 181-189.
 MEADOWS, D. H.; MEADOWS, D. L.; RANDERS, J.; BEHRENS, W.W. The Limits to Growth. Washington DC: Universe Books, 1972.
MOL Arthur P. J.; SPAARGAREN, Gert. Para uma Sociologia dos Fluxos ambientais Uma nova agenda para a Sociologia Ambiental do século XXI. Política e Sociedade Nº 7 outubro de 2005, p. 27-76.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Meio Ambiente e Ciências Humanas. 4ª Edição. São Paulo: Anablume, 2005. 162p.
 SCHNAIBERG, A. The environment: from surplus to scarcity. New York: Oxford, University Press, 1980. SPECTOR, M.; KITSUSE, J. Social problems: a reformulation. Social Problems. 20: 145-159, 1973.
 TAYLOR, D. E. The Rise of the environment justice paradigm. American Behavioral Scientist, 43 (4): 508-580, 2000.
 YAERLEY, S. The green case: a sociology of environmental issues, arguments e politics. London: Routledge, 1992. I


4 Como exemplo as diferentes atribuições ao sentido da palavra ecologia (MORAES, 2005 p. 71-72). 11

 5 O naturalismo se refere à postura filosófica perante a relação homem-natureza na qual a interferência do ser humano na natureza é resumida pelo termo “ação antrópica” neutralizando a dimensão social da temática ambiental. O tecnicismo “dilui as implicações políticas de seu manejo como se a soluções técnicas não envolvesse decisões políticas” e o romantismo que se manifesta pelo “preservacionismo radical” e “perspectivas anti-humanísticas” (MORAES, 2005, p. 53-55). 6 A teoria crítica se refere à Escola de Frankfurt, representadas por Adorno, Horkheim e Habermas, mas nos referimos, também, à crítica marxista feita ao modelo capitalista de produção e consumo, como sendo principal responsável pela crise ambiental atual.



  Este artigo é referente ao trabalho final da disciplina Ambiente e Sociedade, ministrada pelo Professor. Doutor. Horácio Antunes de Sant’Ana Júnior, a qual cursei como aluna especial, no curso de doutorado em Ciências Sociais (PPGSoc/ UFMA).

Nenhum comentário:

Postar um comentário