quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

SABER CUIDAR - Leonardo Boff


Um bom presente de Natal: livro do escritor Leonardo Boff  Cuidar de si mesmo, de nossa família hoje passa por cuidarmos de todo meio ambiente. Nós seres humanos podemos construir uma sociedade e um mundo ambientalmente mais justo.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O ser humano diante os conflitos socioambientais PARTE III

   Demonstrar que amamos, que somos pessoas que querem ser ouvidas, buscar o diálogo, saber por que agimos dessa ou daquela maneira é fundamental para uma boa convivência nas relações humanas. Julgar as pessoas sem avaliarmos o que o mundo está produzindo de conteúdo humano é hipocrisia. O ser humano que busca o amor, que quer amar e assim se conectar com a essência de cada um de nós está no caminho da felicidade. 
   Atualmente dizer que se ama alguém causa espanto. A ideologia dominante
vende a falsidade de que tudo é descartável. Hoje constroem-se relações afetivas e atitudes do ficar. Tudo que não dura, que atende aos prazeres momentâneos vale a pena. Amar é complicado para muitos. Se perdemos nossa condição e capacidade de amar com certeza não vamos amar o meio ambiente, assim como a sociedade vem destruindo e degradando o ser humano fazemos o mesmo com todo meio ambiente.
   O atual modo de produção de sociedade faz dos seres humanos objetos de uso, consumo e não sujeitos. Muitos adultos não sabem lidar com nossa condição e capacidade de amar. Isso incomoda. Educamos filhos para serem consumidores e cada vez menos seres humanos que podem amar e serem amados.
   A sociedade educa jovens e adultos para serem fundamentalistas em várias religiões e menos para sentirem que somos humanos. Que nossos erros não são culpa e sim sinais de que temos condição de ser melhores a cada dia. Manter a população sob a égide do medo e da culpa é oprimir ainda mais as pessoas.
A falta de amor dos adultos, a falta de sintonia com nossa humanidade interior têm levado as pessoas a impor a juventude que o sentido da vida é ter e não ser.
   O caminho de harmonia para o equilíbrio ambiental que buscamos é sem dúvida viver para o amor. Há pouco tempo assistindo ao filme “Conversando com Deus”
inspirado no escritor Neale Donald Walsch, houve uma citação de que o ser humano é movido por duas motivações básicas: o amor e o medo. Mesmo se existem pessoas que não creem em Deus a questão levantada por Neale faz sentido.  Se nós amamos não temos porque ter medo. Tudo que nos provoca medo é o que não pertence a nossa essencial motivação humana. É minha opinião. Para cuidar do meio ambiente é preciso cuidar e valorizar nossa condição humana.
  Na atual conjuntura levar em conta nossa condição humana diante os conflitos socioambientais é fundamental. Os países ainda não chegam a um acordo sobre como deter o aquecimento global, basicamente porque não querem “perder” mercados pelo restrito interesse econômico de minorias.  O caminho continua sendo a mobilização da sociedade civil no Brasil e no mundo. Na Conferência da ONU Rio+ 20 e a Cúpula dos Povos,  a sociedade civil do Brasil e do mundo vão avaliar o que podemos melhorar e o que os Estados e governantes precisam decidir de forma imediata.  Haverá mais uma chance para nossa espécie humana. Todos nós estamos chamados a nos unir com nossas qualidades e defeitos. Fazemos a diferença é nos unindo como sociedade civil no Brasil e no mundo em defesa da vida e de um meio ambiente socioambientalmente mais justo para todos.

    Luiz Cláudio dos Santos

O SER HUMANO DIANTE OS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS - PARTE II

   Todos nós seres humanos precisamos aprender a lidar com nossa humanidade, nossas virtudes e nossos defeitos. Uma pessoa que se julga melhor que outra porque tem mais dinheiro, bens ou poder aquisitivo que outra, ou um ser humano que se julga melhor que outro ser humano pela cor da pele, pelo “status social”, etnia, crença, gênero está doente socioambientalmente falando. Por mais que alguns não queiram aceitar, todos nós seres humanos somos iguais. Geraldo Vandré continua mais atual que nunca quando canta “braços dados ou não” somos iguais. Somos biologicamente iguais. Tudo que está na natureza está no corpo humano.
   Em Belo Horizonte uma Lagoa da Pampulha poluída e degradada como temos hoje reflete a poluição interna e externa dos próprios seres humanos, perdidos em grande maioria diante os conflitos socioambientais. Tendo diariamente sua condição humana relegada a segundo, terceiro planos. Se socioambientalmente adoecemos, adoecemos o meio ambiente. Contaminamos rios, não pensamos cada um de nós em cuidar da floresta Amazônica, aqui em Minas da Serra do Gandarela, ou mesmo de nossa própria casa. Nossa Casa Comum como diz Leonardo Boff é a Terra. Não percebemos que respeitar culturas diferentes, etnias é essencial para a diversidade cultural e as possibilidades de ainda construirmos sociedades e a sustentabilidade que é o meio ambiente sadio e bem de uso comum para todos como prevê o Artigo 225 da Constituição. Por isso defender a floresta amazônica e o direito dos povos indígenas que ali estão vivendo há milhares de anos é nos sintonizarmos com nossa essência humana. O que temos em nosso corpo está na floresta. Agora que surge o debate sobre a usina de Belo Monte é um bom momento para relermos a Carta do cacique Seatle:

O pronunciamento do cacique Seattle

(discurso pronunciado após a fala do encarregado de negócios indígenas do governo norte-americano haver dado a entender que desejava adquirir as terras de sua tribo Duwamish).

    O grande chefe de Washington mandou dizer que desejava comprar a nossa terra, o grande chefe assegurou-nos também de sua amizade e benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não precisa de nossa amizade.
   Vamos, porém, pensar em sua oferta, pois sabemos que se não o fizermos, o homem branco virá com armas e tomará nossa terra. O grande chefe de Washington pode confiar no que o Chefe Seattle diz com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na alteração das estações do ano.
   Minhas palavras são como as estrelas que nunca empalidecem.
   Como podes comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal idéia nos é estranha. Se não somos donos da pureza do ar ou do resplendor da água, como então podes comprá-los? Cada torrão desta terra é sagrado para meu povo, cada folha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada véu de neblina na floresta escura, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados nas tradições e na consciência do meu povo. A seiva que circula nas árvores carrega consigo as recordações do homem vermelho.
   O homem branco esquece a sua terra natal, quando - depois de morto - vai vagar por entre as estrelas. Os nossos mortos nunca esquecem esta formosa terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela é parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo, a grande águia - são nossos irmãos. As cristas rochosas, os sumos da campina, o calor que emana do corpo de um mustang, e o homem - todos pertencem à mesma família.
   Portanto, quando o grande chefe de Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, ele exige muito de nós. O grande chefe manda dizer que irá reservar para nós um lugar em que possamos viver confortavelmente. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, vamos considerar a tua oferta de comprar nossa terra. Mas não vai ser fácil, porque esta terra é para nós sagrada.
   Esta água brilhante que corre nos rios e regatos não é apenas água, mas sim o sangue de nossos ancestrais. Se te vendermos a terra, terás de te lembrar que ela é sagrada e terás de ensinar a teus filhos que é sagrada e que cada reflexo espectral na água límpida dos lagos conta os eventos e as recordações da vida de meu povo. O rumorejar d'água é a voz do pai de meu pai. Os rios são nossos irmãos, eles apagam nossa sede. Os rios transportam nossas canoas e alimentam nossos filhos. Se te vendermos nossa terra, terás de te lembrar e ensinar a teus filhos que os rios são irmãos nossos e teus, e terás de dispensar aos rios a afabilidade que darias a um irmão.
   Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um lote de terra é igual a outro, porque ele é um forasteiro que chega na calada da noite e tira da terra tudo o que necessita. A terra não é sua irmã, mas sim sua inimiga, e depois de a conquistar, ele vai embora, deixa para trás os túmulos de seus antepassados, e nem se importa. Arrebata a terra das mãos de seus filhos e não se importa. Ficam esquecidos a sepultura de seu pai e o direito de seus filhos à herança. Ele trata sua mãe - a terra - e seu irmão - o céu - como coisas que podem ser compradas, saqueadas, vendidas como ovelha ou miçanga cintilante. Sua voracidade arruinará a terra, deixando para trás apenas um deserto.
   Não sei. Nossos modos diferem dos teus. A vista de tuas cidades causa tormento aos olhos do homem vermelho. Mas talvez isto seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que de nada entende.
   Não há sequer um lugar calmo nas cidades do homem branco. Não há lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o tinir das assa de um inseto. Mas talvez assim seja por ser eu um selvagem que nada compreende; o barulho parece apenas insultar os ouvidos. E que vida é aquela se um homem não pode ouvir a voz solitária do curiango ou, de noite, a conversa dos sapos em volta de um brejo? Sou um homem vermelho e nada compreendo. O índio prefere o suave sussurro do vento a sobrevoar a superfície de uma lagoa e o cheiro do próprio vento, purificado por uma chuva do meio-dia, ou recendendo a pinheiro.
   O ar é precioso para o homem vermelho, porque todas as criaturas respiram em comum - os animais, as árvores, o homem.
   O homem branco parece não perceber o ar que respira. Como um moribundo em prolongada agonia, ele é insensível ao ar fétido. Mas se te vendermos nossa terra, terás de te lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar reparte seu espírito com toda a vida que ele sustenta. O vento que deu ao nosso bisavô o seu primeiro sopro de vida, também recebe o seu último suspiro. E se te vendermos nossa terra, deverás mantê-la reservada, feita santuário, como um lugar em que o próprio homem branco possa ir saborear o vento, adoçado com a fragrância das flores campestres.
   Assim pois, vamos considerar tua oferta para comprar nossa terra. Se decidirmos aceitar, farei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.
   Sou um selvagem e desconheço que possa ser de outro jeito. Tenho visto milhares de bisões apodrecendo na pradaria, abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem em movimento. Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante do que o bisão que (nós - os índios) matamos apenas para o sustento de nossa vida.
   O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Porque tudo quanto acontece aos animais, logo acontece ao homem. Tudo está relacionado entre si.
   Deves ensinar a teus filhos que o chão debaixo de seus pés são as cinzas de nossos antepassados; para que tenham respeito ao país, conta a teus filhos que a riqueza da terra são as vidas da parentela nossa. Ensina a teus filhos o que temos ensinado aos nossos: que a terra é nossa mãe. Tudo quanto fere a terra - fere os filhos da terra. Se os homens cospem no chão, cospem sobre eles próprios.
   De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao homem: é o homem que pertence à terra, disso temos certeza. Todas as coisas estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará.
   Os nossos filhos viram seus pais humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio, envenenando seu corpo com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos os nossos últimos dias - eles não são muitos. Mais algumas horas, mesmos uns invernos, e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nesta terra ou que têm vagueado em pequenos bandos pelos bosques, sobrará, para chorar sobre os túmulos de um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso.
   Nem o homem branco, cujo Deus com ele passeia e conversa como amigo para amigo, pode ser isento do destino comum. Poderíamos ser irmãos, apesar de tudo. Vamos ver, de uma coisa sabemos que o homem branco venha, talvez, um dia descobrir: nosso Deus é o mesmo Deus. Talvez julgues, agora, que o podes possuir do mesmo jeito como desejas possuir nossa terra; mas não podes. Ele é Deus da humanidade inteira e é igual sua piedade para com o homem vermelho e o homem branco. Esta terra é querida por ele, e causar dano à terra é cumular de desprezo o seu criador. Os brancos também vão acabar; talvez mais cedo do que todas as outras raças. Continuas poluindo a tua cama e hás de morrer uma noite, sufocado em teus próprios desejos.
   Porém, ao perecerem, vocês brilharão com fulgor, abrasados, pela força de Deus que os trouxe a este país e, por algum desígnio especial, lhes deu o domínio sobre esta terra e sobre o homem vermelho. Esse destino é para nós um mistério, pois não podemos imaginar como será, quando todos os bisões forem massacrados, os cavalos bravios domados, as brenhas das florestas carregadas de odor de muita gente e a vista das velhas colinas empanada por fios que falam. Onde ficará o emaranhado da mata? Terá acabado. Onde estará a águia? Irá acabar. Restará dar adeus à andorinha e à caça; será o fim da vida e o começo da luta para sobreviver.
   Compreenderíamos, talvez, se conhecêssemos com que sonha o homem branco, se soubéssemos quais as esperanças que transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais as visões do futuro que oferece às suas mentes para que possam formar desejos para o dia de amanhã. Somos, porém, selvagens. Os sonhos do homem branco são para nós ocultos, e por serem ocultos, temos de escolher nosso próprio caminho. Se consentirmos, será para garantir as reservas que nos prometestes. Lá, talvez, possamos viver o nossos últimos dias conforme desejamos. Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará vivendo nestas floresta e praias, porque nós a amamos como ama um recém-nascido o bater do coração de sua mãe.
   Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Preteje-a como nós a protegíamos. Nunca esqueças de como era esta terra quando dela tomaste posse: E com toda a tua força o teu poder e todo o teu coração - conserva-a para teus filhos e ama-a como Deus nos ama a todos. De uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus, esta terra é por ele amada. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum.

Fonte: "Trechos de um diário: O Cacique Seattle: Um cavalheiro por instinto". 10º artigo da série “Primeiras Reminiscências” - Seattle Sunday Star, 29 de outubro de 1887 do articulista Henry Smith (tradução livre, pela equipe de Floresta Brasil)

  Artigo - Luiz Cláudio
 

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O ser humano diante os conflitos sociambientais - artigo


   Dizer que estamos todos felizes no Brasil e no mundo poderia ser verdade. No entanto, sabemos das mazelas da sociedade globalizante que os seres humanos estão construindo. Globalizam-se os prejuízos para a maioria dos países e da população mundial e privatizam-se em pequenas minorias os lucros cada vez maiores.
   Estávamos numa aula onde um participante do Curso O Cidadão e o Meio Ambiente, no Centro de Cultura Nansen Araújo em Belo Horizonte, contou uma história. Ele trabalha realizando filmes para a TV Paraguaia sobre os animais silvestres que são feridos diante a agressão dos seres humanos ao meio ambiente pelo interior do país. Em visita a um povo indígena ele entregou um caramelo a uma criança. Ela imediatamente chamou todas as crianças e dividiu um pedaço para cada um. Dividir para aquelas crianças e aquela cultura faz parte do cotidiano.
   Saber que seres humanos ainda são capazes de fazer isso em pleno século XXI é um alento. Podemos ainda pensar que existem civilizações na qual poderíamos refletir culturas. As culturas diversas são ainda esperança de que possamos organizar sociedades ambientalmente mais justas. Por isso valorizar culturas locais, povos, populações tradicionais, seja vivenciar conflitos.
   O individualismo mina cada vez mais o diálogo entre as pessoas. Quando achamos que estamos conversando, estamos exercendo papéis pré-estabelecidos seja na internet através de redes sociais, seja no pouco tempo para a convivência das famílias, das pessoas. O tempo está curto para tantos afazeres impostos pela mídia, pelos ritos de consumo da globalização. Nossa busca pela felicidade ideologicamente conduzida pelo consumo a qualquer preço encontra ao final o vazio de nosso pouco tempo para ouvirmos a nós mesmos se estamos realmente felizes. O medo é patrocinado pela TV e a solução dos conflitos socioambientais parece ser utopia.
   Estamos aqui vivenciando chuvas que vão expondo a inviabilidade das cidades agora, por exemplo, em Minas Gerais – Brasil. Nas Filipinas outro furacão desabrigou e ceifou vidas de milhares de pessoas. Mais alguns indícios da ação humana provocando o aquecimento global. Além de a natureza expor esta condição insustentável pelo mundo, os conflitos seguem no dia a dia com todos os seres humanos, vivendo em cidades adestradas. Os conflitos que geram este aquecimento global têm origem no modo de produção e consumo que vem sendo adotado em todo mundo de forma hegemônica insustentável. Mas ainda acredito que podemos seguir construindo uma melhor qualidade de vida e meio ambiente. Sociedades sustentáveis.     
   Temos condições de melhorar nossas relações humanas que vem também sendo conflituosas em função desta sociedade insustentável. Necessitamos valorizar o que somos mais do que consumimos ou achamos que somos. Relaxar, ouvir uma boa música. Agradecer pelo que de bom ainda existe nesse mundo em seres vivos, recursos naturais e na nossa capacidade de optar pela valorização do que de melhor existe em cada ser humano. E esse diálogo deve ser permanente. Que possamos ser melhores a cada dia e acreditar que nossa ação humana unindo pessoas e instituições em defesa da vida e de todo meio ambiente melhore as condições socioambientais em nosso dia a dia. 
                       
Luiz Cláudio

sábado, 17 de dezembro de 2011

Occupy Wall Street - como os seres humanos distribuem as riquezas produzidas no mundo

   Seria possível aos seres humanos terem do ponto de vista socioambiental um mundo apenas ? Por que então continuarmos dividindo o mundo em primeiro mundo, “países emergentes” (aliás estão “emergindo” para onde ?), os G8, G20 ... ? Haverá condição de nossa espécie humana distribuir as riquezas produzidas no mundo de forma mais justa e igualitária ? Quais são os custos socioambientais desta desigualdade onde 1% da população possui 40% das riquezas produzidas no mundo ? Essa injusta distribuição de riquezas é sem dúvida um dos mais graves problemas de meio ambiente que nossa espécie tem a enfrentar. Qual é sua opinião ? Segue reportagem de Frederico Rampini sobre o movimento Occupy Wall Street.:

  Um por cento da população mundial possui 40% das riquezas do planeta. Eis como vive, onde vive, o que faz e como ele gasta o seu dinheiro aquela parte da humanidade contra a qual (e em nome dos 99% restantes) o movimento Occupy Wall Street está lutando.
  A reportagem é de Federico Rampini, publicada no jornal La Repubblica, 06-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Mãe, o que fazem todas essas pessoas no nosso avião?". O filho de Jacqueline Siegel não conseguia dar uma explicação a si mesmo, na primeira vez que se encontrou na fila de embarque (primeira classe, obviamente) com tantos desconhecidos, ele que estava acostumado a viajar com o seu pai no jato particular da empresa. Bem-vindos ao mundo do 1%.
   Uma categoria social que acabou ficando sob os holofotes da atenção pública graças ao movimento Ocuppy Wall Street: aquele que se autodefine como "os 99%" e denuncia os privilégios da oligarquia. Se você mora em Manhattan, isto é, no coração do protesto, por meio de quais sinais pode-se perceber se você pertence ao vituperado ou invejado 1%?
  Eis 12 mandamentos que traçam a linha de demarcação na vida diária. É um teste empírico, a prova da verdade que trai os verdadeiros privilegiados.
• Primeiro: você se veste rigorosamente made in Italy (com exceção dos sapatos Louboutin), comprando na Bergdorf Goodman da Quinta Avenida.
• Segundo: janta no Masa (o japonês com menus sem preços), Per Se, Marea, Babbo, e pelo menos uma vez por ano você se concede o personal chef com catering de três estrelas.
• Terceiro: mensalidade fixa da Metropolitan Opera, mais doação fiscalmente dedutível.
• Quarto: voa apenas na BusinessFirst, se o Gulfstream não estiver acessível.
• Quinto: nunca anda de metrô, nem mesmo que esteja nevando.
• Sexto: presença assídua em um spa-fitness, com massagista e personal trainer.
• Sétimo: assina o Wall Street Journal.
• Oitavo: férias de verão na Toscana, em Aspen para esquiar, fins de semana na casa nos Hamptons.
• Nono: seus filhos estudam em uma escola privada do tipo Waldorf (pedagogia progressista, mas competitiva), mensalidade a partir dos 30 mil dólares por ano.
• Décimo: nada de conta corrente, mas sim um telefone direto com o serviço personalizado Wealth Management de um grande banco.
• Décimo primeiro: a mansão onde você mora deve ter porteiros uniformizados.
• Décimo segundo: você gosta de cães de raça, mas é o dog sitter que os leva todas as manhãs ao Central Park.
   Essas regras de vida do 1% mudam pouco se você estiver na China, país que recém cruzou o limiar de um milhão de milionários: foi na República Popular que a Burberrys viu suas vendas crescer em 34% em seis meses, que a Zegna inaugurou a sua 70º loja, que a casa de leilões Christie's vendeu por 4 milhões de euros um par de pistolas da era Qing com cabo de ouro incrustado de pedras preciosas.
   Não varia muito no Brasil, onde o poder de compra dos ricos é tão próspero que a Louis Vuitton cobra um ágio de 100% em comparação com os mesmos produtos da sua loja nos Champs-Elysées.
   Estamos falando de uma exígua minoria de extrarricos? São os banqueiros de sempre, magnatas da indústria, estrelas do espetáculo? Não apenas. Nos EUA, os indivíduos com um patrimônio líquido de 1 a 5 milhões – é o limiar acima do qual os gestores patrimoniais os classificam como "altos patrimônios" – são 26,7 milhões. Outros 2 milhões de norte-americanos têm um patrimônio entre 5 e 10 milhões líquidos. Um milhão de pessoas estão sentadas em um ninho de ovos de ouro de 10 a 100 milhões. Por fim, 29 mil estão sentado em cima de 100 milhões de dólares. Todos juntos fazem mais da metade da população italiana.
   Se quisermos ficar com a definição precisa do 1%, isto é, apenas três milhões de norte-americanos, o limite de ingresso é medido com base na renda. Os dados do Internal Revenue Service (a Receita Federal norte-americana) marcam a fronteira exata: é preciso receber uma renda de, pelo menos, 506 mil dólares brutos anuais (375 mil euros) para entrar no círculo dos três milhões de pessoas que são o 1% da população norte-americana.
  Em nível global, para isolar o 1% que está no topo da pirâmide, é preciso voltar às estatísticas sobre o patrimônio, por serem mais homogêneas. O Global Wealth Report do Credit Suisse indica que eles controlam 38,5% da riqueza mundial, e que os seus bens cresceram 29% em apenas um ano: é uma velocidade dupla com relação ao crescimento da riqueza total do planeta.
   Portanto, o Occupy Wall Street denuncia um fenômeno real, aqueles que estão "lá em cima" alçaram voo, distanciando-se cada vez mais da maioria da população. Um fascinante estudo dos historiadores Peter Lindert e Jeffrey Williamson demonstra que nunca na história passada o 1% teve uma cota tão grande da riqueza nacional. Em 1774, quando ainda havia o colonialismo inglês e, portanto, a aristocracia, o 1% dos privilegiados na New England controlavam apenas 9% do total. A nobreza da época vivia em condições menos distantes da média, com relação às novas oligarquias do terceiro milênio.
   Na história norte-americana, a dilatação enorme das desigualdades tem uma data de nascimento: 1982. Não por acaso, é o início da era de Ronald Reagan, marcada por um sistemático ataque ao welfare state, ao poder dos sindicatos, juntamente com políticas fiscais cada vez menos progressivas. É desde 1982 que o 1% se separa do resto, sobe para a estratosfera, amplia as distâncias: no quarto de século posterior, a sua cota da renda nacional mais do que dobrou, subindo acima dos 20%. A parcela de riqueza sobe ainda mais, superando os 33%.
   É a trajetória que última capa da revista The Nation mostra: "Wall Street inventou a luta de classes". Quando esse conceito já havia se tornado um tabu no debate político norte-americano, os ricos se apropriaram dele, e o conflito social sobre a distribuição dos recursos foi vencido por eles.
   Mas também há aqueles que convidam a se compadecer deles. Robert Frank, no seu livro The High-Beta Rich relata a história da família Siegel, aquela do filho que não entende por que tem que subir no avião com desconhecidos. Depois de ter feito sua fortuna no setor imobiliário e ter construído "a Versalhes dos Estados Unidos", em Orlando, na Flórida (23 banheiros, uma garagem para 20 carros, duas salas de cinema), a família teve a sua mansão penhorada pelos bancos quando o mercado entrou em colapso. "Os extrarricos jamais sofreram uma volatilidade tão exasperada da sua fortuna, ligada aos mercados financeiros", explica Frank.
   Portanto, o 1% é uma categoria em risco, de alta mobilidade. Nela se entra e dela se sai com a porta giratória em alta velocidade. Por isso, em 2008, foi aprovado o welfare dos banqueiros: 600 bilhões apenas para salvar Wall Street.