EDITORIAL
ALGUNS PRINCÍPIOS FILOSÓFICOS DA SUSTENTABILIDADE
A crise de civilização que o
Brasil e o mundo enfrentam traz questionamentos da necessidade de construção de
novos paradigmas para que a humanidade seja sustentável. Temas que conflitam
nas ciências sociais como a questão da subjetividade e da razão são parte dos
fundamentos filosóficos da sustentabilide. Uma razão que alimente uma “ética”
do trabalho que oprime o ser humano merece ser questionada. Ao concordarmos que
o meio ambiente sadio é vital para a existência de nossa espécie é preciso que
a sociedade implante o trabalho sustentável. O trabalho que destrói o meio
ambiente em uma sociedade sustentável filosoficamente não é ético. Inclua-se no
meio ambiente o ser humano e as sociedades por nós construídas. Quais
estruturas sociais estão levando os seres humanos a não se perceberem iguais em
natureza?
Dois
séculos e cinqüenta e quatro anos nos separam das idéias do fílósofo precursor
da sociologia Jean-Jacques Rousseau. Em sua obra Contrato Social (1762) sua
filosofia argumenta que a natureza humana é essencialmente boa. Para ele nós
humanos nascemos “naturalmente bons e iguais” e a vida em sociedade nos
corrompe e nos faz diferentes. Este debate percorre as teorias das ciências
sociais há séculos sobre as contradições entre as estruturas sociais e a ação
dos indivíduos. Ainda estas questões não foram solucionadas pela humanidade.
Que caminhos vêm percorrendo a humanidade que ainda edifica estruturas sociais
onde bilhões de seres humanos vivem em condições
de miserabilidade e precariedade e poucos ostenta luxo e riqueza? Podemos
argumentar a hipótese de que alguns povos indígenas e comunidades tradicionais
são sustentáveis porque há uma coesão socioambiental de valorização do ser
humano e de sua comunidade que procura se harmonizar com o meio ambiente. São
exemplos que comunidades sustentáveis são possíveis.
Refletindo que toda ação
humana é subjetiva ela está inscrita em um meio socioambiental. Somos resultado
das relações socioambientais que construímos. Acha-se “natural” cobrar juros
abusivos, porque a estrutura econômica fomenta esta atitude, por que não achar
“natural” agirmos pela nossa essência de considerarmos que todos os seres
humanos possuem “naturalmente” o direito de viver com dignidade, saúde,
educação, cultura, lazer, meio ambiente saudável? O mundo chegou a um ponto tão
irracional que questionar o mercado que instiga o “super consumo ilimitado” é uma heresia. É um pecado.
Argumentar que para vencer “a crise” é preciso implantar medidas que penalizam
ainda mais os excluídos de uma qualidade vida e meio ambiente saudável é
utilizar uma razão sem uma ética sustentável. Dizer que uma empresa é ética e
possuiu uma gestão ambiental exemplar e, no entanto, na sua gestão de recursos
humanos mantêm critérios racistas quando da avaliação de desempenho de seus
funcionários é não ser sustentável. Afinal quais os interesses econômicos,
socioambientais de se fomentar esta “crise”? Onde está a sua subjetividade e a
razão? Podemos argumentar que esta “crise” brasileira possuiu mais de quinhentos
anos, pois aqui havia quatro milhões de índios e os recursos naturais que
fomentam o “desenvolvimento” e as “tecnologias” de última geração em todo
mundo, boa parte foram e são retirados de nosso território desde que
descobriram por aqui as árvores que deram origem ao nome ao nosso País. Quem vai apurar as vidas perdidas e os desvios
destes recursos naturais que mantêm a maioria do povo brasileiro na miséria? A
história do País-Árvore chamado Brasil traz consigo a história da opressão
predatória que a civilização insustentável vem construindo há séculos.
Razão e subjetividade eis aí
um dilema. Havendo uma concordância com Rousseau de que o ser humano é
essencialmente, ou “naturalmente” bom, a sociedade poderia ser melhor uma vez que somos nós que edificamos estas
sociedades? Haveria possibilidade do ser humano construir sociedades onde o
valor da pessoa humana, do meio ambiente fosse prioridade? Não é isso que
presenciamos na gestão das políticas públicas de saúde, educação, esportes,
cultura, étnica, economia, comunicação, gestão das terras, lazer, trabalho e meio ambiente.
A liberdade de imprensa e
manifestação, por exemplo, que é condição universal dos direitos humanos deve ser respeitada. A democratização dos
meios de comunicação é um direito socioambiental fundamental para a construção
de um Brasil e um mundo melhor.
A nossa consciência socioambiental está
pautada pelos objetivos de nossas ações, pelo trabalho que a vida em sociedade
nos impulsiona. Milhões de pessoas no mundo hoje percebem que lutar pela
melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida de todos nós seres humanos
traz um sentido a nossas vidas. Qual o lugar socioambiental que ocupamos? Se um
ser humano vive em situação degradante não é estranho eu me preocupar com esta
pessoa. Pois a situação de um ser humano degradado é fruto e responsabilidade de
todos nós. É o espelho da sociedade e do que nossa atitude socioambiental
provoca. Se não percebo um ser humano de minha espécie degradado, como posso
perceber que o meio ambiente vem sendo destruído pelas sociedades
insustentáveis? Fica um questionamento:
o que me aliena afinal da minha condição de sujeito que age e transforma esta
realidade? No “Contrato Social” Rousseau lembra que alienar é dar ou
vender. Ele argumenta: “Ora um homem que
se escraviza ao outro não se dá, vende-se, pelo menos em troca da subsistência;
mas um povo porque se vende ele”? (Contrato Social – pág.15). A maioria da
população brasileira está escravizada nesta pressão política, econômica,
socioambiental de nos colocar como objeto que só sabe consumir, consumir,
consumir... ódio e tristezas? Muito oportuno lembrar as palavras de Mahatma
Gandhi “todo aquele que possui mais do que precisa para viver é um ladrão”. Mandiba,
Nelson Mandela sintonizado com nossa essência “natural” trouxe sabedoria, “se o
ser humano aprendeu a odiar ele pode aprender a amar seu semelhante.”
Rosseau poderia ser lembrado pela forma como
algumas emissoras de TV e grande mídia disputam à audiência divulgando a
maldade, a violência, as péssimas ações dos seres humanos em sociedade e não as
boas ações e bons frutos que nossa espécie pode colher edificando comunidades e sociedades mais
felizes e menos predadoras dos próprios seres humanos e do meio ambiente. Ser
realista não é apenas reafirmar o mal é, sobretudo valorizar o que temos de
bom. Não se vê questionamentos sobre como as riquezas produzidas pela humanidade
estão sendo apropriadas de forma tão desigual em tantos séculos de história e
suas conseqüências de outras inúmeras violências contra os seres humanos e o
meio ambiente do qual fazemos parte. E diga-se, muito menos em canais de mídia que angariam contribuintes
para algumas religiões pela falta de perspectivas das sociedades insustentáveis
se vêem estes questionamentos.
Concordando com a sabedoria de alguns seres humanos, nossa espécie pode evoluir e
vencer a barbárie das atuais sociedades insustentáveis. Caminhos para construirmos
a sustentabilidade a partir da união dos melhores saberes que resgatam nossa
essência humana mais feliz e saudável é possível.